"MÁRIO FILHO, QUE DEU NOME AO ESTÁDIO do Maracanã, irmão mais velho do Nelson Rodrigues, escreveu livros fundamentais sobre o futebol, nem por isso se sentia realizado como escritor.
Com as mesmas obsessões que fizeram o irmão ficar famoso, Mário passou a vida querendo escrever um livro sobre o Carnaval de 1919. Nunca teve tempo para realizar seu sonho. Mas os amigos dele sempre ouviam-no falar desse carnaval histórico. Seus cabelos cor de fogo, seus olhos também de fogo, ficavam incendiados quando lembrava o Carnaval daquele ano.
Justifica-se. O Rio enfrentara a Gripe, assim mesmo, na maiúscula. Uns a chamavam de Espanhola, matou até o presidente da República. Em 1918, a Morte vagava pelas ruas e pelas casas, onde os mortos se amontoavam e nem havia uma infra-estrutura mortuária para dar conta dos enterros.
O sujeito começava a atravessar a rua na vertical, em gozo de saúde exemplar, chegava na outra calçada na horizontal, fulminado pela Gripe.
Bem, a Peste foi embora e o Carnaval de 1919 seria a vingança da Vida contra a Morte, da Saúde contra a Gripe. A esbórnia foi total. Na delegacia do Catete, que cobria a rua Santo Amaro, onde funcionava o High Life, registraram-se 2.000 casos de defloramento, recorde que o Mário, arregalando os olhos, dizia ser mundial.
Eu não era nascido na época, mas conheci ao longo da vida muitos filhos da Gripe, o produto final desses 2.000 defloramentos só na jurisdição da delegacia do Catete.
Hoje não temos nem Gripe (com maiúscula) nem defloramentos, palavra e função que saíram de moda. Mas herdei do Mário essa obsessão pelo Carnaval de 1919, a que não assisti, como não assisti à batalha de Salamina, à morte de César e à invasão otomana na península Ibérica.
Não pude aproveitá-lo. Mesmo assim tenho saudade dele."
- Folha de S. Paulo, 25/02/01, domingo de carnaval.
Ilustração: Carnaval no Rio de Janeiro.
Um comentário:
Amauri,
Quero te agradecer pelas palavras escritas em meu blog, o Recanto das Palavras e também te parabenizar pelo excelente trabalho em seu blog. Achei muito interessante você ter postado um texto do Cony sobre o carnaval seguinte ao surto da gripe espanhola. Farei um link no post que escrevi sobre a febre amarela.
Isto me fez lembrar de um outro caso, aquela transmissão radiofônica da Guerra dos Mundos, pelo Orson Welles e que levou o Assis Valente, imagino que logo após ter lidos os jornais da época, a escrever um samba chamado “E o Mundo Não Se Acabou”. Você poderá encontrá-lo no link a seguir: http://recantodaspalavras.wordpress.com/2008/01/17/e-o-mundo-nao-se-acabou-70-anos-depois/
Quanto aos mp3´s das músicas, eu apenas fui pesquisando, a partir de minha experiência como professor, pois faço uso constante de músicas e tudo mais que estiver relacionado ao que leciono, em sites e repositórios de músicas que são compartilhadas. Isto nem sempre é garantia de obter sucesso, pois os sites saem do ar com uma certa regularidade. Mesmo assim, eu te indico o Seeqpod (www.seeqpod.com) e o deezer (www.deezer.com). Além, é claro de você fazer buscas através de programas de compartilhamento como o e-mule.
ps. Sua informação sobre o samba do Martinho a respeito do Machado de Assis foi excelente saber da existência. Obrigado.
Um grande abraço,
Jorge Alberto
http://recantodaspalavras.wordpress.com
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